INTRODUÇÃO
O conteúdo deste livro se resume a enumerar e a descrever, em detalhes, métodos para se cometer suicídio. Nada além. Não se trata de uma reportagem investigativa, tampouco teoriza sobre o assunto. Apesar de dissertar sobre conteúdos diversos, todos os vetores desta obra estão direcionados a um único ponto: procedimentos para tirar a própria vida.
Estou cansado de escutar sempre a mesma ladainha.
Há muito, interroga-se por que os jovens buscam a morte. Questões que são repetidas de novo, de novo e de novo. E invariavelmente se chega a alguma brilhante conclusão — a falta de motivação da geração posterior à Segunda Guerra, por exemplo. Apesar de todo o esforço dispensado, porém, permanecem sem respostas perguntas de igual ou maior importância: por que seguir vivo? E por qual razão o suicídio é proibido?
Chega. Faz-se urgente uma obra que disponibilize alternativas para se matar.
Recordo-me de um livro, publicado na década de 1980, que igualmente alardeava técnicas para tirar a própria vida, mas que se resumia a uma tagarelice limitada a apenas enumerá-las. Enfadonho e irritante.
Neste momento, é essencial ao leitor ter acesso a métodos para se suicidar. Apenas isso.
CHERNOBYL
Sempre ansiei pelo chamado Grande Evento. A catástrofe. Escassez de petróleo, ditadura global soviética. Algo. Toda vez, acreditava piamente que, agora, seria o Grande Evento. No entanto, não passaram de terremotos de escala média. Superadas as tragédias, olhávamos sorridentes uns para os outros e comentávamos: “Uau, desta vez foi quase”.
Nos anos derradeiros da década de 1980, houve um boom de apocalipse. Proliferavam as chamadas conversas perigosas. Bandas de rock consagravam canções a Chernobyl. As crianças pressentiam a proximidade da morte e moças casadouras buscavam parceiros que, dentre outras prerrogativas, estivessem preparados para o armagedom. A sensação de que o Grande Evento estava próximo era palpável — e excitava. O mundo deixaria de existir.
Só que o mundo permaneceu. As usinas atômicas não explodiram. O tão prometido holocausto nuclear foi uma falácia.
Foi quando compreendi: o Grande Evento era uma mentira e a humanidade daria as boas-vindas ao século 21. Agora, o que nos restava era espiar a morte por frestas. Em tais circunstâncias, caso alguém ansiasse por um estímulo indescritível, a única alternativa seria o suicídio.
FÉRIAS PROLONGADAS
Inútil reclamar do tédio. Estamos predestinados, por azar, ao período histórico em que vivemos.
Acordaremos todos os dias às sete da manhã e iremos para a escola ou para o trabalho, onde repetiremos as mesmas conversas fúteis e sem sentido. No colégio, memorizaremos vezes sem conta vocabulários em inglês e nomes de períodos históricos. No escritório, repetiremos ciclos semanais, mensais e anuais durante semanas, meses e anos. Maçante.
Sempre aparecerão novos restaurantes da moda, os políticos permanecerão corruptos, a televisão seguirá vomitando a costumeira avalanche de informações. Porém, basta desligar o controle remoto e olhar em torno. Lá estará ela: a imutável rotina.
Em seu romance autobiográfico Confissões de uma máscara, Yukio Mishima escreveu ser “a vida cotidiana mais terrível que a guerra”. E, enquanto suportamos o insuportável, permanecemos em uma “rotina terrível, de causar calafrios”. Avançamos cautelosos pelo caminho, passo a passo, atentos para não pisar em falso. Só que não existe um final feliz como nas novelas. Apenas um falso conceito de felicidade.
Repetição infinita: o combustível que inflama o desejo pela morte.
ANOTHER BRICK IN THE WALL
Em 1978, aconteceu aquele que ficaria conhecido por suicídio amidakuji.
Foram descobertos, enforcados em uma floresta, os corpos sem vida de duas irmãs gêmeas que viviam na província de Toyama e cursavam o primeiro ano colegial. No caderno de uma delas, havia uma loteria amidakuji (em inglês, ghost leg) em que foram traçadas quatro linhas verticais e algumas horizontais. Na parte inferior, estavam escritas palavras pouco compreensíveis. Após algumas quebras, a linha traçada desde o topo terminava em suicídio. Como sequer os pais foram capazes de atestar o motivo do gesto, o suicídio acabou sendo creditado à sorte.
No passado, julgava-se que a vida humana seria preciosíssima. Trata-se de um equívoco absurdo, percebido pelas gêmeas de Toyama. No final dos anos 1970, a banda inglesa Pink Floyd cantou sermos apenas mais um tijolo no muro, música que se tornou um imenso sucesso. Nos dias atuais, o estado das coisas permanece idêntico — seguimos insignificantes tijolos. Evidência disso é que, tão logo alguém morre, outro ocupa o seu lugar. Nenhuma vida é insubstituível. Nenhum político é digno de ser assassinado. Se um tijolo for destruído, o muro não desmorona.
Tanto faz existir ou desaparecer. Ou seja, a vida não tem importância. Este é o segundo fator que desperta o desejo de morrer.
LARANJA MECÂNICA
Impotentes, repetimos as mesmas atividades vezes sem fim e, aos poucos, esquecemos da chamada alegria de viver. Afinal, em tais circunstâncias, não estaríamos mortos? Já não sabemos a resposta.
“Que felicidade, estou vivo!” Como era mesmo essa sensação?
“A vida é o bem mais precioso que existe”, “Permaneça vivo, algo bom acontecerá”, “Caso se mate, fará sofrer amigos e parentes”. As frases que antes impediam o suicídio há muito não fazem efeito. Foi dado o sinal verde para a prática do suicídio. Afinal, já estamos mortos ao ir para a escola ou para o trabalho, entediados e sem alegrias. Portanto, sugiro que dê o passo, atravesse a tênue linha divisória e morra. Ninguém será capaz de impedir.
Mesmo que se mantenha vivo, nada mudará. Não é necessário sensibilidade paranormal para prever os eventos futuros, sejam em escala pessoal ou global. Sua vida se resumirá a frequentar o ensino fundamental e o médio, prestar vestibular enquanto faz o curso preparatório, matricular-se na faculdade e, após quatro anos de estudos ociosos, acabar contratado por uma empresa qualquer. Caso seja do sexo masculino, se casará após os 25 anos e, no ano seguinte, terá um filho. Será transferido e promovido, obterá algum sucesso profissional e, quem sabe, chegará a chefe de departamento. Aos 60 anos, será aposentado de forma compulsória e, depois, passará uma década ou duas distraído com hobbies. E morrerá. Com pequenos desvios, é esse o caminho. E, o que é pior, o exemplo de uma vida ideal que supostamente proporcionaria paz de espírito.
É desesperador.
Em tais circunstâncias, existir não faz sentido. Não se trata de viver, mas de permanecer vivo, como um frango de corte. Dar um basta à vida no momento adequado, portanto, é uma conduta bastante positiva.
ANGEL DUST
Tenho um conhecido que sempre carrega consigo no pescoço um colar com uma cápsula metálica contendo uma droga potente chamada angel dust, fenciclidina. Ao ser ingerida, a cabeça se dissocia da realidade, o que possibilita ao indivíduo pular de um prédio sem hesitar. “Quando chegar a hora, é só tomar”, ele diz. E assim vive, sem emprego fixo e despreocupado.
Gostaria que este livro tivesse a mesma função da cápsula de metal.
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