Não é de hoje que anti-heróis fazem sucesso, às vezes mais do que os próprios bons-moços. Chupa, Homem-Morcego. É este o caso do clássico chinês Shuihu zhuan, Margem da água, publicado em meados do século 14 e cujo enredo é um pinga-sangue onde são glorificados os atos criminosos de uma facção de cento e oito delinquentes, sempre conforme um rígido código de honra estabelecido entre os ladrões.
No Japão, a obra foi traduzida no século 16 e recebeu o título Suikoden 水滸伝, desencadeando adaptações, paródias e crossovers. Havia versões para todos os públicos. Em comum, a predominância do texto em detrimento das ilustrações, em geral genéricas e, portanto, desinteressantes.
Até que uma edição mudou o cenário por completo.
O primeiro Suikoden em que o conteúdo visual se equiparava ao escrito teve o volume inicial publicado em 1805. Tratava-se do Shinpen suiko gaden 新編水滸画伝, Suikoden: nova edição ilustrada. O autor do texto era ninguém menos que Kyokutei Takizawa Bakin 曲亭滝沢馬琴 (1767-1849) e, para fazer frente ao gigante das letras, foi convocado o artista de ukiyo-e Katsushika Hokusai 葛飾北斎 (1760-1849). Porém, após a impressão dos dez volumes iniciais — o conjunto completo possuía noventa tomos, divididos em nove partes —, Bakin se retirou do projeto, que foi então repassado para o escritor e tradutor Takai Ranzan 高井蘭山 (1762-1838).
Tornou-se um best-seller.
Shinpen suiko gaden apresentava personagens tatuados, os primeiros em uma publicação japonesa. Um deles era Kyumonryu Shishin 九紋龍史進, Shishin dos Nove Dragões, que, conforme o nome, ostentava nove lagartões distribuídos pelo corpo. Nas imagens de Hokusai, as tatuagens de Shishin são pequenas e individualizadas, ainda no estágio denominado nukibori 抜き彫り, sem a incorporação de fundo característico.
As ilustrações favoreceram a difusão de uma prática que ganhava forças no começo do século 19: a tatuagem decorativa, que, dissociada da ideia de punição, deixava de ser imposição estatal para se tornar ornamento feito de livre e espontânea vontade. Em seus desenhos corporais, os citadinos enalteciam não somente a estética, mas os grupos aos quais pertenciam.
Surgia o horimono 彫り物, coisa gravada.
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